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Líderes indígenas são intimados a depor por suposta difamação ao governo federal
Atualizado: 6 de jul. de 2021
Funai e PF investigam a ação de líderes indígenas no combate contra a Covid-19

Por Anna Araia e Nayara Delle Dono
Em abril de 2021, os líderes indígenas Sônia Guajajara e Almir Suruí foram intimados pela Polícia Federal (PF) a depor para a instituição. A convocação foi feita pela Fundação Nacional do Índio (Funai), sob pretexto de difamação do governo federal e do presidente Jair Bolsonaro.
Sônia Guajajara é coordenadora executiva da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e foi convocada para prestar esclarecimentos sobre a websérie Maracá - Emergência Indígena, que é produzida pela associação. A série, disponível nas redes sociais da Apib, aborda a falta de amparo às populações indígenas na contenção da pandemia de Covid-19.

Enquanto isso, Almir Suruí, líder da tribo Paiter Suruí - uma das mais afetadas pela Covid-19 no estado de Rondônia -, foi intimado por conta da campanha de crowdfunding “Paiter: Povos da Floresta Contra Covid-19”. Segundo a Funai, ela também teria conteúdo difamatório contra o governo federal.
“A Funai e o governo Bolsonaro promovem perseguições para constranger as lideranças indígenas, para deslegitimar nossas lutas e reafirmar sua sórdida e genocida política de destruição ambiental e de extermínio dos nossos povos. Tentam calar nossas vozes, mas não conseguirão”, disse Almir em suas redes sociais após a abertura do inquérito na PF.
No entanto, os processos contra Sônia e Almir não foram para frente, sendo arquivados, respectivamente, nos dias 5 e 6 de maio. Para o juiz federal Frederico Botelho de Barros Viana, responsável pelo arquivamento do caso de Sônia, não há provas da “existência de abuso de exercício de direito ou de cometimento de qualquer espécie de crime, seja contra terceiros, seja contra a União”.
A situação alarmante da Covid-19 entre povos indígenas
De acordo com o site Agência Pública, em fevereiro de 2021, a comunidade indígena Potiguara do Catu, localizada no Rio Grande Norte e que conta com 226 famílias, não vacinou seus membros contra a Covid-19 por falta de reconhecimento do governo federal. Mesmo que presentes no plano nacional de vacinação como “grupos prioritários”, é necessário que os indígenas estejam em terras demarcadas pela Funai.
Enquanto isso, no ano passado, o território Yanomami sofreu com avanço de 30% do garimpo ilegal. A presença dos garimpeiros ameaça os povos locais, uma vez que pode aumentar o contágio da Covid-19 e demais doenças como a malária, além de destruir a fauna e flora local.

O contexto se mostra ainda mais preocupante quando os dados atuais disponibilizados pela Apib são analisados: até o dia 17 de junho, o número de indígenas mortos pelo coronavírus foi de 1.112 e os casos confirmados ultrapassam os 55 mil. Ademais, 163 tribos foram afetadas pela doença.
Mudanças no comando da Funai
Marcelo Xavier assumiu o cargo de presidência da Funai em julho de 2019, após ser escolhido pelo presidente da república Jair Bolsonaro. Ele é advogado e delegado da Polícia Federal no estado de Mato Grosso.
De acordo com o site Brasil de Fato, Xavier posicionou-se a favor dos ruralistas na CPI da Funai de 2016. O atual presidente da Funai também atuou ao lado dos invasores na terra indígena Marãiwatsédé em 2012, e em 2016, solicitou providências à PF contra indígenas e ONGs no Mato Grosso do Sul.
O órgão, que em tese deveria proteger os interesses indígenas, possui atualmente uma administração de histórico com interesses ruralistas, ideias radicais e divergentes à proteção das florestas e dos povos que nelas habitam.
No último dia 17 de junho, diversas lideranças do povo Munduruku protestaram em frente à Funai exigindo conversar com o presidente Xavier. Diversos usuários utilizaram a hashtag #LevantePelaTerra para trazer mais visibilidade a respeito da violência sofrida pelo povo Munduruku.
Apesar de o protesto ter ocorrido de forma pacífica, os indígenas foram recebidos com gás lacrimogêneo ao reivindicar seus direitos contra o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que propõe o fim da demarcação de terras indígenas. O PL favorece a flexibilização de terras demarcadas para uso do agronegócio e implantação de empreendimentos que ameaçam as comunidades locais.
Edição: Nayara Delle Dono
Revisão: Anna Araia e Nayara Delle Dono