- Isabele Scavassa
O que o aumento de energia termelétrica revela sobre a crise hídrica no país?
Pesquisa revela que em agosto a usina bateu recorde de energia gerada no Brasil

Por Isabele Scavassa
As usinas termelétricas (UTE) têm conquistado maior espaço nos últimos meses. Desde agosto, os números vêm aumentando, de modo a bater recordes na geração de energia térmica no país. Quem confirma isso é o estudo divulgado pelo veículo de notícias CNN, feito em parceria com a ONS, o qual revela que só em agosto, as UTEs alcançaram 20.970 megawatts-médios (MWmed) de energia gerada.
Antes mesmo de entender o que esses dados podem revelar sobre o atual cenário energético brasileiro, é válido comentar sobre o funcionamento desse tipo de usina. As termelétricas utilizam diversos tipos de materiais que ajudam a movimentar as turbinas que geram a energia elétrica de fato. Entre eles, constam insumos renováveis e não-renováveis, como as biomassas (cana de açúcar, cascas de arroz e madeira) na primeira categoria e óleo, carvão e gás natural na segunda.
De acordo com o levantamento feito pela Empresa de Pesquisa de Energia (EPE) em 2021, as UTEs representam a segunda maior fonte de energia dentro da matriz brasileira. Na prática, essa usina gera cerca de 25,53% da eletricidade do país, atrás apenas da fonte hidrelétrica, que abrange 65,2% da fatia total.
Como é possível observar nos números da matriz energética, as usinas que têm a água como fonte principal são as que mais geram energia no Brasil. As termelétricas, portanto, assumem um papel secundário nessa questão e só conseguem maior destaque em casos de crise hídrica.

Impactos causados pelo aumento de energia térmica
Em entrevista ao Impacto Ambiental, o professor de Engenharia de Energia da Unesp Leonardo Lataro Paim explicou que uma das consequências do uso das termelétricas é a geração de gases durante o processo que podem ser causadores do efeito estufa.
“Dependendo da composição química do combustível utilizado são produzidos gases como os óxidos e dióxidos de enxofre, óxidos de nitrogênio, monóxido e dióxido de carbono, hidrocarbonetos, outros gases e particulados”, explica Leonardo.
Quando questionado sobre o impacto vivido na prática, o professor explica que a curto prazo, os materiais particulados podem causar problemas respiratórios, como infecções dos brônquios e outras doenças pulmonares. “Ainda a curto prazo, esses óxidos de nitrogênio e enxofre podem gerar chuvas ácidas afetando fauna, flora e edificações”, complementa.
Outro aspecto que pode ser levado em consideração no quesito das usinas termelétricas é o custo que elas geram na produção de energia e, consequentemente, no valor atribuído à tarifa ao final do mês.
Nesse sentido, Leonardo explica que o Brasil tem um sistema de bandeiras tarifárias na cobrança do consumo de energia. Quando as termelétricas são acionadas, a bandeira vermelha é ativada – o que significa que será cobrado um valor adicional na fatura mensal. A justificativa para o aumento fica por conta do uso de combustíveis derivados de petróleo que são suscetíveis a variações cambiais por serem commodities, processos de importação, logística de transporte e custo operacional.
A correlação entre UTEs e a crise hídrica
A crise hídrica tem se tornado um dos assuntos mais comentados nos últimos meses em decorrência da falta de chuvas. A falta de água interfere em diversos aspectos, inclusive na geração de energia (principalmente em um país no qual a principal fonte de energia é a hidrelétrica). Uma série de fatores pode ser considerada como causadora da falta de água, entre elas o mau gerenciamento dela, o aumento populacional e as questões climáticas.
Um dos maiores consumidores de água, hoje, é o setor agrícola. As informações divulgadas pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), destacam que 70% da água consumida é de responsabilidade dos produtores de alimentos, irrigação e pecuaristas. Atrás da agricultura, está a indústria, consumindo 22% do total. Essas questões também precisam ser consideradas no planejamento para pensar melhores alternativas na administração deste recurso finito.
No que diz respeito às condições climáticas, vale lembrar que o desmatamento visto na Amazônia em 2021 interfere diretamente na questão das chuvas. Todo o processo de interferência no ambiente implica no impedimento da evapotranspiração – efeito natural que é responsável pela transferência de água de uma região para outra por meio da atmosfera.
Todas essas problemáticas podem culminar no que os especialistas chamam de “insegurança energética”. Nesse sentido, o professor conclui que, “o maior risco para a insegurança energética são medidas e atos governamentais incabíveis”, como a extinção do horário de verão, uma medida simples mas que costumava economizar energia. Ainda na visão de Leonardo, o cenário atual reforça que “o Brasil precisa começar a atuar com medidas preventivas e não corretivas”.
Edição: Nayara Delle Dono Revisão: Nayara Delle Dono